Domingo, dia 14 de maio de 2006, Dia das Mães, 20:40 horas.
Na Igreja Metodista “Fonte de Vida”, ao lado de casa, o Pastor Claudinei Krepski fazia a pregação ao microfone, quando, o som, de repente, pifou. Largou o aparelho no púlpito e ia recomeçar o culto a viva voz, quando um barulho abafado chamou a atenção dos fiéis. Alguém comentou que bateram em algum carro na rua. Na verdade, era uma porta de carro sendo fechada violentamente.
Em casa, na sala próxima à rua banhada pela luz amarelada da iluminação pública, em companhia da minha esposa, Elisângela dos Santos de Souza Ibanhes, eu assistia à tevê. O Fantástico noticiava as rebeliões do PCC nas penitenciárias, inclusive em nossa Dourados, e os policiais que já haviam sido mortos pelos bandidos em São Paulo. Dizia eu à mulher que os chefes dos bandidos usavam terno e gravata, e que aqueles presidiários agiam sob proteção de gente graúda. Mal acabara de falar, o vidro da janela foi estilhaçado por um artefato jogado de fora. No segundo imediato uma grande bola de fogo e fumaça negra explodiu na sala. O cobertor, com o qual nos aquecíamos devido ao frio que fazia, entrou em combustão. Minha esposa colocou as mãos para proteger o rosto e elas se incendiaram, assim como os meus pés. Tentei abafar o fogo, mas quanto mais me debatia, mais ele recrudescia devido à gasolina de que a manta estava impregnada.
Tentei apagar o fogo nas mãos da mulher, que apenas murmurava “está queimando... está queimando...”, em estado de choque. Aos tapas apaguei o fogo nos pés, pois a dor era insuportável. As chamas se propagaram rapidamente pelo sofá e pela estante. “Pega a nenê e sai para fora!” – mandei. A menina, com seis anos, estava no quarto ao lado, aprontada para dormir. Com o barulho, a criança saiu do dormitório e vinha pelo corredor quando a mãe, a passos de desespero, a levou para fora. Eu, vendo que o fogo tomava conta da sala, e devido a dor das queimaduras, saí para fora com o cobertor em chamas e joguei-o sobre a grama do jardim.
A sala do atentado |
Alguém devolveu meu grito, orientando para que eu desligasse as chaves da energia elétrica. Voltei para dentro da sala em chamas, e atravessando a parede de fogo e fumaça, consegui chegar ao meio da casa onde estavam as chaves, que desliguei. No escuro, os clarões do fogo alumiavam assustadoramente. A televisão explodiu com o calor, bem como os dois monitores de computador na sala. Ao tentar recuperar meus documentos, as chamas e a fumaça fizeram com que eu retrocedesse e procurasse logo outra saída, pelos fundos. Rodeando a casa ganhei a rua.
O que sobrou do sofá onde assistíamos à tevê |
A mão dilacerada da esposa |
Queimaduras nos pés do escritor |
Elisângela entregou a nenê nos braços da vizinha. Ao agarrar a criança, a pele da mão se soltou, e como uma luva ameaçava escapar pelos dedos. A vizinha, aterrorizada, empurrou de volta a pele ao lugar. Na ânsia de diminuir a dor terrível, minha mulher balançava os braços sem parar e tremia toda sob o impacto do terror.
Os bombeiros chegaram; prestaram atendimento a minha esposa, a seguir a mim. A ambulância nos levou para o hospital Evangélico. Enquanto estávamos sendo medicados, policiais militares adentraram o ambulatório, efetuando a nossa identificação. Minha esposa permaneceu internada, e eu, depois de medicado, voltei para casa com o Dr. Eberhardt. Quando lá cheguei, os bombeiros estavam recolhendo seu material de rescaldo. Fui colocado, com os pés enfaixados, numa cadeira de fio na calçada, de frente para a casa, que, às escuras, e envolta em fumaça negra e espessa, apresentava um aspecto sinistro.